Em Bromionte, na Macedônia, bem no norte da Grécia, vivia em
paz o rei Midas, um soberano ávido de prazeres refinados e de todo tipo de
riqueza. Gostava especialmente de percorrer as alamedas do imenso e maravilhoso
jardim que margeava seu suntuoso palácio. Nesse jardim, o que o rei mais
apreciava era aspirar o perfume das rosas cultivadas para ele.
Um dia, quando os jardineiros estavam guardando as
ferramentas, um deles ouviu um barulho estranho, que vinha de uma moita. Fez
sinal aos companheiros para que se calassem, e todos ouviram um ruído surdo e
regular, às vezes interrompido por resmungos.
Aproximando-se com cuidado, os jardineiros descobriram um
ser estranho, encolhido no chão. Tinha corpo de homem e pés de bode. Era um
sátiro que, quase morto de tanto vinho, estava deixando a bebedeira passar.
Agarraram a estranha criatura e levaram-na ao rei. Ainda
cambaleando e falando com voz pastosa, o sátiro declarou a Midas que se chamava
Sileno e que era companheiro e amigo de Dioniso, o deus das uvas e do vinho.
Ao conhecer a identidade de seu visitante, Midas mandou
soltá-lo e, depois que Sileno descansou e comeu, foi levá-lo a Dioniso.
A alegria do deus ao reencontrar Sileno foi enorme. Mandou
abrir vários barris de vinho e deu uma festa ao som de flautas e pandeiros.
Quando as danças finalmente cessaram, Dioniso disse que desejava agradecer a
Midas. Propôs satisfazer um desejo do rei. Qualquer um.
Acontece que Midas era muito cobiçoso, e isso o fez
responder sem pensar:
– Meu maior desejo no mundo é que tudo em que eu toque se
transforme em ouro.
O deus achou bem maluca a ideia, mas, já que tinha
prometido; concordou e proporcionou o dom que Midas acabara de pedir. Assim que
ficou sozinho em seus aposentos, o monarca começoua experimentar seus novos
poderes. Tocou uma mesa e foi um deslumbramento: o móvel de simples madeira se
transformou em ouro maciço. Aconteceu o mesmo com uma taça de estanho e uma
espada de bronze. Maravilhado, Midas ficou frenético. Saiu tocando tudo o que
estava a seu alcance. Em pouco tempo, tudo no palácio tinha virado ouro maciço.
Tudo quanto era enfeite, móvel, as próprias colunas do prédio, as árvores do
jardim... Ouro puro, brilhante, cintilante. De longe dava para ver o brilho do
palácio de ouro de Midas, faiscando sob os raios do Sol poente.
No entanto, o rei percebeu que a noite se aproximava. Ele
estava com fome. Chamou os escravos e mandou servir o jantar, sendo
imediatamente obedecido. Faminto, Midas jogou-se sobre os pratos deliciosos que
lhe traziam. Mas as carnes douradas, as frutas suculentas, os queijos que
queria levar à boca, tudo se transformava em ouro no instante que ele os
tocava.
Inquieto e desapontado em sua gulodice, fez outra tentativa.
Aconteceu o mesmo. Chamou os empregados, mas todos se afastaram dele, querendo
ficar bem longe de um homem que tinha um poder tão terrível.
Então Midas, alucinado de fome e de solidão, começou
finalmente a refletir e percebeu que o dom de Dioniso condenava-o a uma morte
rápida. Ficou apavorado e, chorando, implorou ao deus que o livra-se daquele
poder assustador e mortal.
Dioniso deu boas gargalhadas quando viu a que ponto a cobiça
levara Midas. Mas ficou com pena e aconselhou-o a logo tomar um banho na
nascente do Páctolo, um rio próximo ao monte Tmolo. Midas obedeceu e, ao sair
da água, viu com alívio que seu dom funesto desaparecera. Desde esse dia, as
águas do Páctolo carregam sempre uma porção de pepitas de ouro.
Depois de uma aventura tão desastrosa, Midas devia ter
aprendido a ser mais cuidadoso com os deuses. Mas não aprendeu e meteu-se em
outra enrascada.
Apolo, deus do Sol, ia disputar um concurso de música com o
sátiro Mársias. Midas, que tinha sido aluno do célebre músico Orfeu, foi
designado um dos juízes. Quando os dois terminaram de tocar, ficou evidente
para todo mundo que Apolo era muito melhor que Mársias, mas Midas resolveu
dizer o contrário, numa teimosia estúpida. Apolo foi declarado vencedor, mas
resolveu castigar Midas por sua total falta de sensibilidade musical - e
transformou as orelhas do rei num par de orelhas de burro, bem grandes.
Midas ficou muito sem graça. Para disfarçar, só aparecia em
público com um gorro de lã, escondendo as orelhas. Não o tirava nem para
dormir, com medo de que os outros ficassem sabendo.
Mas o tempo foi passando, e a barba e o cabelo do rei foram
crescendo. Chegou o momento em que não dava mais para adiar o corte. Então,
mandou chamar o barbeiro e, quando ficou sozinho com ele, fez o homem jurar que
guardaria segredo sobre o que ia ver. O barbeiro levou o maior susto quando viu
as peludas e imensas orelhas do rei, mas não disse nada. Fez direitinho seu
trabalho e foi-se embora do palácio o mais depressa que pôde. Depois, porém,
foi ficando difícil para o barbeiro guardar um segredo tão grande, apesar de
ter dado sua palavra e de temer a cólera do rei. No fim, quando já não
aguentava mais, teve uma ideia. Foi a um lugar isolado, perto do rio, cavou um
buraco na terra e, quase encostando á boca no chão, murmurou lá para dentro:
– O rei Midas tem orelhas de burro...
Tapou rapidamente o buraco e foi embora.
Mas um caniço bem ao lado, curvado pela brisa, começou a
murmurar:
– O rei Midas tem orelhas de burro...
Todos os caniços das redondezas fizeram a mesma coisa.
O murmúrio cresceu e virou um clamor. Dava para ouvir até á
cidade. Dali a algumas horas, todo mundo falava das orelhas do rei. Todo mundo
ria. O pobre soberano caiu no ridículo e passou a viver para sempre trancado em
seu palácio, lamentando, mais uma vez, não ter tido prudência e bom senso. Mas já
era tarde.
QUESNEL, Alain. A grécia. Mitos e lendas. (Trad.: Ana
Maria Machado). 6ª Edição. São Paulo: Editora Ática, 1996.
A PALAVRA É...
01ª Reescreva as frases substituindo a palavra destacada por
um sinônimo correspondente.
a) “[...] um soberano ávido
de prazeres refinados e de todo tipo de riqueza.”
b) “Gostava especialmente de percorrer as alamedas do imenso e maravilhoso jardim
[...]”
c) “Era um sátiro
que, quase morto de tanto vinho, estava deixando a bebedeira passar.”
d) “Acontece que Midas era muito cobiçoso, e isso o fez
responder sem pensar [...]
e) “Maravilhado, Midas ficou frenético.”
f) “[...] as frutas suculentas, os queijos que queria levar
à boca [...]
g) “Então Midas, alucinado
de fome e de solidão [...]
h) “[...] quando viu a que ponto a cobiça levava Midas.”
i) “[...] viu com alívio que seu dom funesto desaparecera.”
j) “Mas um caniço
bem ao lado, curvado pela brisa, começou a murmurar [...]”
l) “O murmúrio cresceu e virou um clamor.”
m) “[...] não ter tido prudência
e bom senso.”
ANÁLISE DA LEITURA
02ª Mito é um relato fantástico de tradição oral geralmente protagonizado
por seres que encarnam, sob forma simbólica, as forças da natureza e os
aspectos gerais da condição humana”.
a) O rei Midas é o personagem principal da história que você leu. Que
aspecto da natureza humana ele poderia representar?
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b) Considerando a definição acima, explique por que o mito é narrado em
3ª pessoa.
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03ª O rei Midas vivia tranqüilo em seu luxuoso palácio, apreciando a
beleza das flores de seus jardins. O que a descoberta do sátiro Sileno
conseguiu provar quanto ao caráter do rei Midas?
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04ª Ao conhecer a identidade de Sileno, o rei Midas mandou soltá-lo, e o
levou até Dionísio, deus das uvas e do vinho.
a) Na sua opinião, Midas já esperava alguma recompensa do deus Dionisio
por sua “boa ação”? Esclareça sua resposta.
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b) Dionisio achou maluca a ideia de Midas? Por quê?
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05ª Midas sentiu-se maravilhado com o seu extraordinário poder. Durante
algum tempo, experimentou seu novo dom.
a) Você acha que as pessoas gananciosas agem de forma irrefletida? Por
quê?
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b) Midas obteve o que mais sonhava: transformar em ouro tudo o que
tocasse. Que consequências foram produzidas por essa conquista?
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O6ª Consciente de seu ato impensado, Midas suplicou humildemente ao deus
Dionisio que o livrasse daquele poder.
- Que lição de vida se pode aprender com a experiência do rei Midas?
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07ª Livre do terrível poder, Midas ainda se mostrou insensato, ao desafiar
o deu Apolo, declarando-o inferior a Mársias, como músico, apenas por teimosia.
- O que há de comum entre essa atitude e o pedido que Midas fizera a
Dionisio?
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08ª O castigo do deus Apolo causou imensa vergonha a Midas, que passou a
esconder suas enormes orelhas com um gorro.
- Explique por que a atitude de Apolo afetou tanto a vida de Midas.
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09ª O barbeiro de Midas, apesar das ameaças do rei, acabou revelando o
castigo de Apolo, e a novidade se espalhou por todo o reino. Na sua opinião, em
geral, por que muitas pessoas não sabem guardar segredo?
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